Réquiem por um fugitivo

sábado, 6 de março de 2010

''... Foi só então que tive a minha suspeita- pois ateé esse momento não passara de uma suspeita- confirmada. As dúvidas se diluíram e eu tive certeza: tratava-se realmente de um anjo. Não sei se arcanjo ou serafim, mas indubitavelmente, irreversivelmente, inconfundivelmente- um anjo...O que aconteceu foi apenas um clarão enorme e um ruído quase ensurdecedor de asas, como se diz mesmo?Ruflando, é isso: um ruído quase ensurdecedor de sas ruflando. Em seguida saiu pela janela aberta, alcançou galhos mais altos dos plátanos desfolhados e desapareceu. Julguei ainda ouvir a voz dele dizendo que voltaria, mas não explicou quando. Não sei também se disse isso apenas por gentileza, para me consolar, ou se realmente pretende voltar um dia.

O que nunca pensei é que pudesse ser assim tão vazia uma casa sem um anjo. Dentro de mim existe alguma coisa que espera a sua volta, de repente, não sei se pela janela ou se aparecerá novamente no mesmo lugar. Para prevenir surpresas, tenho deixado sempre abertas todas as janelas e todas as portas de todos os guarda-roupas.''


Caio Fernando Abreu


Ao meu anjo que cuida de mim todos os dias, mas que deixou um vazio imensuravel nesta casa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário